sábado, 29 de agosto de 2009

"Eu não quero ser juiz"



É 1h20 de uma madrugada quente, como geralmente são as madrugadas pantaneiras, mas o que não me deixa dormir, não é o calor e sim as palavras, as idéias que martelam meu cérebro em virtude de a poucas horas ter deixado as instalações do Centro Municipal de Cultura, onde os acadêmicos do 7º semestre do Curso de Direito, proferiram palestra sobre o tema "Morosidade na Justiça". Uma iniciativa louvável dos acadêmicos em parceria com o Rotary Club de Cáceres, Emaj e Faculdade de Direito.

Nessa palestra além dos acadêmicos, dos rotarianos, do representante do Executivo municipal, alguns poucos professores do curso de Direito e oportunamente encontravam-se lá dois representantes do Judiciário mato-grossense, e um deles o Dr. Gonçalo, juiz lotado na 2ª Vara Criminal de Cáceres, que nos presenteou com profícuos esclarecimentos técnicos. Declarou o magistrado ser um apaixonado pela academia, e manifestou-se sobre um tema que já se tornou corriqueiro no ambiente acadêmico, que se relaciona com atitude da imprensa nacional e estadual que hoje estão (não só hoje como bem sabemos) a serviço de coronéis do executivo, totalmente direcionada a atacar e acanhar o poder judiciário em suas diversas jurisdições pelo país. Ressaltou o meritíssimo juiz, "a imprensa hoje acusa, julga condena, e ainda julga recurso de quem tenta se defender". Entretanto, o que me preocupa fazendo-me perder o sono para escrever minhas considerações, são as preocupações que me assaltaram durante a palestra.

As ponderações do Dr. Gonçalo, com relação ao silêncio do judiciário, neste momento em que forças políticas inescrupulosas procuram denegrir a imagem do judiciário como um todo. Questionei o referido juiz quanto ao silêncio daqueles que se julgam prejudicados por esta blasfêmia campanha, e ouvi atônito sua resposta: "...De que regulamentos internos do judiciário, leis, impõem silêncio aos magistrados, não permitemque se manifestem à altura, que se defendam, que se manifestem em público a respeito de certos assuntos". Abusando da bondade e paciência dos demais presentes, tentei materializar timidamente uma reflexão constitucional, em que afirmei ter para mim claro que: A tripartição dos poderes contida na nossa Constituição Federal, de inspiração montesquiana e alardeada no art. 2º de nossa Carta Magna não condiz com a nossa triste realidade, pois a "autonomia e independência" entre os poderes com relação ao judiciário não passam de palavras; e como bem exemplificou o Dr. Gonçalo, questionando de como são formados o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça? São escolhidos entre os membros do Judiciário? Eleito por eles? Não, não são como bem sabemos.

Torno a repetir o que me tirou o sono e a paz de espírito não foi exatamente o até aqui exposto. Tentarei fazer uma retrospectiva de minha simples vida.

No ano de 1978 quando adentrei na UFMT como acadêmico do Curso de Direito, muito jovem na época - contava com 18 anos apenas, e sonhava um dia ser juiz, mas problemas diversos fizeram-me abandonar aquele maravilhoso curso, e consequentemente "o sonho". No entanto em 1997 volto a estudar e mais uma vez ingressei numa universidade pública, com o intuito de cursar a apaixonante Faculdade de Direito. Agora com quarenta e um anos de idade, "o sonho" já não é tão nítido, e nesta madrugada veio a se acabar, NÃO QUERO SER MAIS JUIZ, disse a mim mesmo, porque se para ser juiz, terei que calar a minha voz, aprisionar-me em mim mesmo, abrir mão do maior bem jurídico do ser humano que é a liberdade, pois não acredito na morte do ser. Volto a repetir EU NÃO QUERO SER JUIZ, se para tal tiver deixar de lado o que faço agora, ou seja, me expressar, sinceramente, se as regras são estas, prefiro continuar a ser cidadão livre à ser instituição sem liberdade.

Certa vez disse o aprendiz de poeta ESUARK: "De que me adiantariam as asas se o vôo fosse limitado"


Sábado, 30 de outubro de 1999.

Ronaldo de Mattos Krause
Acadêmico do Curso de Direito - UNEMAT

* Lembro-me como se fosse hoje, o dia em que o telefone tocou. Eu estava com 11 anos, eu atendi a chamada e escutei alguém alegre dizendo: "- Avisa o Krause, que ele passou no vestibular!". Era a terceira tentativa dele, quando decidiu voltar a estudar. Fomos ao pátio da Universidade e constatamos que ele tinha passado em 15º lugar. E foram as conversas, e as novidades da faculdade, com a qual ele estava tão animado, que me fizeram ir pelo mesmo caminho. A foto fora tirada por um dos amigos da "Mesa 14", à época em que ele ainda estava estudando. Ele e o "Carlão" numa manifestação contra aqueles que estavam fazendo da nossa Carta algo descartável.

Um comentário:

Éverton Vidal Azevedo disse...

Gurreiro e corajoso, o seu pai.